Minha lista de blogs

sábado, 22 de abril de 2017

J. ARAÚJO



.
Um depoimento do próprio artista
                 Minha família é da Bahia, precisamente do interior - Conceição de Coité. Nem sei como andam as coisas por lá ou se alguma hidrelétrica a engoliu. Sei que era um lugar lindo e eu menino ia com minha mãe visitar os pais dela. De lá tenho muitas e muitas recordações: do passeio de trem, da linda viagem, do apito, da batida do coração de ferro dele e da estação. Coisa de conto de fadas.
                 Tive uma infância no mato da roça, da mangueira, do abacate, do açude e do riacho. Meu avô Argemiro pegava as melancias verdes e desenhava meu nome - Natinho, como me chamavam.  Elas iam crescendo e, quando grandes, ele vinha com uma nos braços e me mostrava: eram umas melancias enormes, dava pra sentar em cima. Lá na roça fui vendo as cores, as borboletas e as flores. Minha mãe gostava de desenhar e eu ficava olhando. Eu dizia que ela escrevia figuras. 

                 

                 Fui internado no colégio dos Irmãos Maristas, onde cursei o primário, depois fui para o Dois de Julho e de lá para o Rio de Janeiro, onde meu pai escolheu para continuar a sua jornada. E de pau de arara chegamos aqui. Fomos para pensões e depois para o Hotel Argentina no Catete. Foi dura e linda essa odisseia. Estudei no Colégio Guanabara e no Rio de Janeiro, mas eu não gostava de estudar. Acabei saindo e, fazendo mais tarde o artigo 99, entrei para a Escola de Belas Artes e também para a de Desenho Industrial ao lado do Automóvel Club. 


                 Já rapaz, com uns 17 anos, andava eu em Copacabana com um quadro em cada mão, na maior cara de pau oferecendo para as pessoas, e um dia, entrando no "Lucas", um rapaz de cerca de uns 30 anos me chamou. Mostrando um livro pra mim perguntou: 
- Você sabe o que é arte naif?
-  Não, não sei. 
-  É esta arte que você pinta. Você pode ir na minha galeria que fica ali, logo depois da Sá Ferreira. 


              Aí tudo começou. Fiz a primeira exposição com a ajuda dele no Hotel Miramar e depois fiz outra na Montmartre Jorge, sua galeria-loja-brechó, tudo junto, lugar encantador. Jorge Beltrão foi o primeiro marchand cearense brasileiro com sotaque francês e o maior do Brasil. Ele é quem colocou a Arte nas paredes da sociedade da época. 







VEJA TAMBÉM > SITE - PINTORES DO RIO - artistas que pintaram o Rio.

             NOTÍCIAS SOBRE J. ARAÚJO 
              De 15 de Agosto até o 18 de setembro de 2016, J. Araújo fez uma belíssima exposição "naif"  na Casa de Cultura de Teresópolis. 
              Veja abaixo o texto da Secretaria de Cultura daquele importante município fluminense.
               "Um ingênuo" veterano, com uma obra reconhecida internacionalmente. Assim pode ser definido o pintor "naif" Jonathas Araujo - ou J. Araujo, seu nome artístico -, que acaba de inaugurar exposição na Casa de Cultura Adolpho  Bloch, em Araras, organizada pelo curador da Casa, Ricardo Guarilha. A mostra pode ser vista até 18 de setembro, de segunda a domingo, das 10 às 17 h.
               Nascido em Salvador, Bahia, em 1940, morador do Rio de Janeiro, para onde veio com os pais aos 8 anos. Frequentador de Teresópolis, J.Araujo iniciou sua experiência artística como autodidata por influência da mãe e, em 1957, deu seus primeiros passos na pintura. Morador de Copacaban, alí teve a oportunidade de conviver com pintores hoje famosos e conheceu Jorge Beltrão, o primeiro marchand brasileiro que, encantado com a sua arte "naif", convidou-o para expor na galeria Montmarte Jorge, de sua propriedade. Foi a primeira exposição individual de J. Araujo. A partir daí, sua carreira como pintor teve grande ascensão e suas obras foram expostas em dezenas de galerias no Brasil e em cidades como Frankfut, Nova York, Lousanne e Zurich, além de passarem a pertencer a acervos de museus internacionais, como Anatole Jakowisky, na França; Museu de Pully, na Suíça; e, no Brasil, no Museu Internacional de Arte Naíf, no Rio de Janeiro. 
                Além disso, Araujo desenvolve seu trabalho como ilustrador para produtos variados de marcas tradicionais no Brasil e no exterior, criando também incríveis imagens para catálogos, livros infantis, didáticos, calendários e cartões de Natal, expandindo sua arte a diversos suportes, sem perder, no entanto, a essência original."
Secretaria Municipal de Cultura.

               OUTRAS IMAGENS DE J. ARAUJO







Pesquisa e postagem: Nicéas Romeo Zanchett 

                   J. Araujo foi descoberto por Jorge Beltrão. Naquela época o Jorge era jovem e tinha uma galeria em Copacabana; tinha também um restaurante chamado "La Palete" onde os clientes se deliciavam com pratos franceses e, ao mesmo tempo, viam arte exposta à venda. 
                  Mas quem foi esta figura tão importante para a arte brasileira? Ele foi o primeiro Marchand do Brasil e o Araujo o conhecia muito bem porque foram grandes amigos. J. Araújo também foi muito amigo do Guignard; eram dois beberrões de Whisky. 
                  Jorge Beltrão começou sua vida profissional como moldureiro de quadros. Foi ele quem trouxe para o Brasil as molduras patinadas e folhadas a ouro; trouxe também os famosos "passe par tute" . Estava sempre inovando e foi ali que conheceu grandes artistas e colecionadores que passaram a ser seus clientes.
                  Conheci Jorge Beltrão em 1973. Eu era amigo do seu irmão Ivan Beltrão, um gênio com multi-talentos que nunca vou esquecer. Este nos deixou cedo, mas nos deu um grande presente, sua filha "Kátia" - Catherine Beltrão - da Arte na Rede. 
                   Eu tinha apenas 25 anos e o Jorge me convidou para ser diretor de sua fábrica de móveis chamada Montparnasse e de sua galeria chamada Montrartre Jorge. 
                   Jorge foi um verdadeiro encantador de pessoas. Sabia identificar grandes talentos e J. Araújo e uma prova viva disso. 
                   Naquela época eu nada sabia sobre artes plásticas e foi através do Jorge que conheci pintores famosos como Djanira, Silvio Pinto, Iberê Camargo, Carlos Anesi, Benjamim Silva, Inimá de Paula e tantos outros. Não cheguei a conhecer J. Araújo pessoalmente,  mas conheci sua arte porque o Jorge tinha uma pintura sua no seu apartamento da Rua Toneiros. Ele me deu uma aula sobre arte naíf e elogiou muito o Araújo. Foi Jorge que lançou Panceti e Guinard, amigo do Araujo. Realizou  grandes exposições com Di Cavalcanti e muitos outros. 
                  A Montmartre era o grande "point" de arte da época; foi muito importante para a minha descoberta das artes plásticas. Quando Jorge descobriu que eu tinha algum talento artístico resolveu me ensinar um pouco do que sabia e assim me transformar num futuro marchand. Nossa convivência era diária; eramos vizinhos na Avenida Rui Barbosa e nos finais de semana andávamos de bicicleta e jogávamos fresco-bol no aterro do Flamengo. 
                  Encontrei algumas fotos de uma das muitas viagens que fizemos à Bahia para comprar madeira. 
Jorge e nosso comprador de madeira na Bahia.

Jorge negociando com os peões madeireiros

Jorge em Porto Seguro - BA.

Jorge em Itamarajú - BA. 

Jorge e  eu em Porto Seguro.

Jorge se exibindo para as garotas da praia. 

Hora do almoço num "pé sujo" beira de estrada em Feira de Santana - BA.

Eu, dando uma olhada no motor que estava esquentando, lá pelos lados de Eunápolis. 
                Estávamos em Porto Seguro e o Jorge passou meio dia tentando convencer o padre local a lhe vender a porta de uma antiga igreja que estava com boa parte podre. Convidou o padre e juntos fomos comer muqueca de camarão. Ele argumentava que iria fabricar uma porta nova, no mesmíssimo estilo, e mandaria instalá-la; quase o convenceu, mas no final o bom senso foi mais forte ;tratava-se de patrimônio histórico.  Era muito criativo e um grande vendedor; acho que seria capaz de vender picolé na Sibéria. 
                Numa certa ocasião estávamos na loja e chegou uma senhora reclamando que seu móvel estava riscado; o Jorge então foi olhar e era a assinatura dele (ele tinha assinado algum documento em cima do móvel e ficou marcado); ele então falou:-  minha senhora, o móvel colonial é como uma obra de arte e quando está assinado tem maior valor. A mulher saiu toda feliz e nunca mais reclamou. 
                 Ele trocava de mulher a cada dois anos e sempre mais jovem; era um verdadeiro escravo dos hormônios. Essa mania que ele tinha criava muita instabilidade em sua empresa. Sempre que aparecia uma nova mulher trazia consigo alguns familiares ou amigos e convencia o Jorge a contratá-los. Isso era um sério problema porque virava cabide de emprego. Tínhamos grandes discussões à respeito, mas ele sempre convencia. 
                 Jorge sabia reconhecer um grande pintor. Ele lançou Pancéti, Guignard, e também o J. Araújo que é a prova viva da boa arte brasileira. 
                 Deixei a Montmartre por volta de 1977 e criei meu estúdio de decorações na Praia de Botafogo.
Nicéas Romeo Zanchett 

                  

Nenhum comentário:

Postar um comentário